CCC ou o 3C do “mundo digital” – Crédito, Consenso e Compensação. Como fica?

O ano nem precisa ser 2023. A discussão sobre como citar trabalhos, direitos de uso de um trabalho e cobrança sobre trabalhos realizados vem de longe.

No mercado de ferramentas de inteligência artificial que se usam de bases de treinos de conjuntos de dados diversos, o que significa “criar” neste mundo? Na prática, nada se cria, pois tudo vem de algo de base, treinado previamente.

Crédito = Quem fez?

No mundo do desenvolvimento de software, o site StackOverflow lista uma série de respostas para perguntas realizadas. Nas respostas muitas vezes existem descrições técnicas de como resolver um determinado problema, muitas vezes com pedaços de código que se pode usar. Pela licença de uso, todo e qualquer conteúdo publicado por lá se torna conteúdo do StackOverflow.

Quem contribui, faz por querer apoiar outras pessoas nos seus desafios. No tempo em que eu fui mais ativo nos processos de fóruns de internet, eu usava perguntas para atalhar pessoas nos seus problemas, quando tinha pouco tempo. E sempre escolhia perguntas que eu não tinha resposta, para poder estudar o tal assunto relacionado. Claro, o assunto era importante ou curioso pra mim. Tiveram casos mais recentes, onde as minhas referências levavam para algum repositório git para apresentar algum exemplo / possível solução.

Aqui no blog eu faço posts muitas vezes para poder lembrar de coisas e faço questão de indicar de onde vieram as origens. Um dos posts mais famosos neste ano, que acaba caindo em buscas do google, fala sobre uma configuração do git, e no final eu indico de onde veio a informação original, que me motivou a fazer um post em português, pra eu não esquecer.

Consenso = Pode usar?

Todo o conteúdo deste blog é feito usando uma licença creative commons, onde você pode usar qualquer conteúdo aqui presente, se quiser inclusive para ganhar dinheiro em cima das minhas reflexões, pode remixar, mas só tem uma coisa… precisa dizer que foi daqui que você puxou a informação.

No caso do mundo da música, de pessoas que fazem uso para reacts ou comentam sobre músicas, alegam que deveríamos ter o conceito do “fair use” quando se está usando o conteúdo para estudo ou para comentar. Não queremos ganhar os direitos autorais da música. Só que mesmo nestes casos, precisa ter um consenso. No caso do fair use se discute o propósito de uso, contexto, tempo de uso e para qual mercado estamos usando o conteúdo em questão.

E nem estou falando aqui sobre samples (Francisco Espectro fala muito melhor sobre isso). Também deixo uma referência da UBC que fala sobre desafios e atenção para o licenciar uso de samples.

A discussão sobre licenças chega forte em código fonte também, com as diversas licenças disponíveis e liberdades do software livre. Tudo vai discutir se você pode ou não pode usar, e de que forma pode usar.

Na dúvida? Não use. É o que eu acredito, mas não é suficiente a gente se conscientizar e auto organizar.

No mundo atual (de 2023), artistas estão deixando declarações registradas impedindo o uso de sua voz e sua imagem quando não estiverem mais vivos, muito no olhar de deep fakes e deep voices e pessoas criando filmes / propagandas que podem ser tecnicamente lindas e emocionantes, mas! E quem não está mais por aqui? Quem cuida?

No Brasil, um caso chamou atenção… uma artista conhecida por embates políticos com uma marca aparece estrelando uma propaganda da mesma marca… e aí? Pode? A artista já morreu faz algumas décadas (caso de Elis Regina chamou a ideia de um projeto de lei). Pode usar a imagem? Quem dá consenso?

Toda nova tecnologia, vai gerar perguntas e provavelmente algum tipo de regulamentação. O tempo vai dizendo sobre estas necessidades.

Compensação = Quem ganha? E ganha quanto?

O jogo das licenças ajudam no entendimento de como um determinado conteúdo pode ser utilizado. Usado, licenciado, aberto, gratuito, proibido. E como você e sua arte podem se posicionar.

No fim do dia é como organizamos e recebemos pelo trabalho realizado. Quando eu publico meu trabalho no youtube, estou sabendo que nada ganharei antes do meu conteúdo ter X mil horas assistido. E quando ganhar, é um valor que valoriza quem “toca” muito, e não me ajuda em nada.

Meu processo com conteúdo foi buscar projetos de crowdfunding para apoiar na geração de receita e me permitir seguir fazendo conteúdo “gratuito” pro youtube (quer dizer, eles ganham em cima do meu conteúdo, eu não). Só que… tudo são escolhas. E eu estou usando essa plataforma para poder fazer este movimento de divulgar meu trabalho e me conectar com pessoas e marcas que queiram me contratar.

Também inicio uma jornada com cursos, livros e minha estrutura de mentoria, que me ajuda a levantar recursos para poder financiar outros projetos.

Agora… o meu entendimento sobre compensação fica mais visível, na questão da exploração do trabalho, quando começo a estudar sobre música. Ok, quando começo a estudar sobre história do capitalismo também, mas isso é assunto para outro momento.

E as histórias que eu vivi foram me mostrando diversas situações… e eu não entendia a profundidade do que estava acontecendo. Exemplos:

  • Em 2023 eu conversando com Marcelo Corsetti sobre produção musical e falando da obra dele (youtube | spotify) e a discussão sobre royalties e o quanto não valorizado a grande gigantesca maioria das pessoas artistas não são nestas plataformas. Cheguei a fazer um texto anterior sobre arte e este processo por aqui.
  • Em 2023, a partir de conversas com Marcelo Corsetti, assisto o documentário sobre o Spotify. Tirando tudo “de bom” que este movimento pode ter causado, seja em tecnologias, e tudo de ruim que ele causou pro mundo (do processo de compensação e até sobrou até pro mundo das metodologias de desenvolvimento de software com uma galera querendo o “modelo spotify” na sua empresa).
  • Em 2023, também a partir de conversas com Marcelo Corsetti, caio em publicações de Suricato e Andre Frateschi. E depois Mary Spender, essa última que me chamou atenção por um detalhe. A youtuber tem mais de 700 mil pessoas assinando o canal, e ainda assim na hora de lançar um disco ela opta por lançar CD e Vinil… e vai colocar nas plataformas de streaming apenas depois de um determinado tempo.
  • Em 2014 eu descubro Amanda Palmer (a clássica TEDTalk) e descubro que a campanha de crowdfunding recordista no kickstarter foi dela. E que isso aconteceu pelo modo como ela era “analisada” pela gravadora. Vinte mil álbuns era pouco para vender. Vinte mil pessoas apoiadoras em uma campanha de crowdfunding te torna um recorde e um ícone no mundo. E aí? Hoje em dia ela segue no processo de produção contando com a compensação dos fãs no seu projeto no Patreon.
  • Em 2007 Radiohead lança “In Rainbows” que funciona no modelo “pay what you want“. As pessoas poderiam pagar o valor que estivessem a fim de pagar e poderiam baixar as músicas.
  • Em 2003, aparece o MySpace, que era para ter causado alguma diferença para quem produzia música, mas não sobreviveu. Nunca estudei as motivações do final do MySpace, mas deve ter alguma relação com a indústria da música ou simplesmente pelo facebook ter tomado conta do espaço das redes sociais.
  • Em 2000 eu descubro Derek Sivers, que talvez você conheça dos livros ou da talk sobre iniciar um movimento, criou a CDBaby em 1998, que era uma forma de publicar música independente. E começa a querer mudar o jogo para quem queria publicar sua música.

Tudo isso para dizer que eu sou parte do problema, vivi o problema, hoje estou vendo o problema de forma mais clara e gostaria de entender como podemos facilitar o processo de compensação de quem faz arte sem todas camadas de intermediação que fazem o valor adequado para os artistas “nunca chegar”. Farei isso através de eventos, conversas, crowdfunding e coisas que ainda não aprendi.

— Daniel Wildt

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